terça-feira, outubro 03, 2006


Nem sempre os grandes momentos são feitos de grandes acções, palavras, gestos. Na maior parte das vezes os nossos grandes momentos não passam de meras banalidades que, a determinado ponto, fazem um sentido diferente. Como se as rodas que põe o mundo girar puxassem todas na mesma direcção. Suavemente na mesma direcção e tudo se move em câmara lenta e os confettis caem do céu porque naquele momento tudo é bom.
Desses dias guardo pequenas coisas palpáveis que, aos olhos estranhos, não passam de pequenos nadas. Para mim são tesouros que me transportam para esses lugares onde ousei ser feliz. São como pequenos passaportes mágicos que me levam de regresso ao passado.
O bilhete de cinema do filme que mal vi porque estava ocupada com outras coisas, o guardanapo do restaurante onde tive aquela conversa com aquela pessoa, a colher de gelado com o azul de um futuro que desejo com os dentes cerrados, de medo, de excitação, de alegria...de medo.
A contracapa do caderno escrevinhada à pressa e em segredo por um amigo que se transformou em algo mais. Um tímido escondido numa capa de coragem que eu tanto desdenhava…que quando se mostrou tímido transformou-se aos meus olhos na pessoa mais corajosa que conheci.
As palavras de uma mãe triste e sem saída. A calculadora xpto que o meu pai me ofereceu com a esperança vã de que me ajudasse a ser melhor na matemática. A receita de um doce que planeamos fazer a quatro mãos naquele natal de 96 antes do tempo se ter esgotado para um de nós…e nem tive tempo de dizer adeus!
Desses grandes momentos, que nos marcam para sempre, tento guardar tudo o que os meus sentidos conseguiram reter. Tudo tem um gosto próprio, a sombra de uma carícia, um cheiro morno a pinheiros mansos, o dedilhar de uma guitarra, a cor de um fim de tarde.
Queremos viver sempre nesses momentos que dão a cor à nossa vida, desejamos que todos os dias sejam uma pequena explosão de alegria e muitas vezes eles passam e nem os vemos passar.
Passam também assim os meses, as estações mudam, folhas caem e voltam a nascer e nós andamos adormecidos a ver a vida fugir.
Parecemos macacos numa jaula do jardim zoológico. Vemos as pessoas que passam. Alimentam-nos, param por segundos, tiram fotografias mas, acabam sempre por partir. Assim é a vida. Sentamo-nos, aceitamos o que ela nos dá, olhamos para ela, guardamos dois ou três momentos e assistimos incrédulos ao fim.
Um amigo disse-me aqui há uns dias qualquer coisa como: “temos de viver os dias como se fossem vidas pequeninas”. Talvez isso altere a nossa percepção de eternidade, não sei.
Mas eu estou cansada de dizer adeus. Mais que isso, estou cansada de dizer adeus com os olhos, com o coração. Fechar a alma e dizer baixinho “adeus”, gostei de te conhecer neste pedaço de vida que partilhamos, mas adeus. E é isso que mais me dói, a efemeridade das coisas, tudo tem um fim anunciado ao princípio. Eu vejo-o, sinto-o a chegar antes de lhe ouvir os passos, tento imaginá-lo bem longe. Mas ele acaba sempre por chegar, leva-me o que tenho e em troca deixa-me a saudade.

1 comentário:

Anónimo disse...

Eu posso não estar aí. Eu posso não te ouvir num determinado momento. Eu posso estar chateada. Eu posso não saber o que dizer. Eu posso querer falar em vez de ouvir. Eu posso ser estúpida. Eu posso querer fugir. Eu posso dizer coisas que não penso. Eu posso cometer muitos erros. Eu posso desiludir-te. Eu posso estar do outro lado do mundo. Eu posso fechar os olhos e só ver o que quero. Eu posso esquecer-me de tudo. Mas eu NUNCA te vou dizer adeus*